Maputo, 19 de Outubro de 2025 — Centenas de pessoas reuniram-se este sábado, na capital moçambicana, para homenagear os advogados Elvino Dias e Paulo Guambe, mortos a tiro em plena via pública a 19 de Outubro de 2024, no período pós-eleitoral. A cerimónia, marcada por forte carga emocional e apelos à justiça, contou com a presença de familiares, colegas da Ordem dos Advogados, representantes de partidos políticos e organizações da sociedade civil.
O acto decorreu na Avenida Joaquim Chissano, local onde ambos foram brutalmente assassinados, e incluiu uma vigília com deposição de flores e velas. A iniciativa foi organizada por amigos e membros da Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), com o apoio do partido PODEMOS, para quem as mortes continuam a simbolizar “o preço pago por defender a verdade e a democracia”.
“Um ano depois, ainda não há respostas. A impunidade é o maior insulto à memória destes dois cidadãos”, declarou Venâncio Mondlane, candidato presidencial nas eleições de 2024, de quem Elvino Dias era assessor jurídico.
Um crime político ainda sem culpados
O assassinato de Elvino Dias, advogado de causas de direitos humanos e figura próxima da oposição, e de Paulo Guambe, delegado eleitoral do PODEMOS, ocorreu poucos dias depois da votação de 9 de Outubro de 2024, marcada por denúncias de fraude e contestação ao resultado que deu vitória ao candidato da FRELIMO, Daniel Chapo.
De acordo com relatos da época, a viatura em que seguiam foi alvejada com mais de 20 disparos por indivíduos não identificados, na noite de 18 para 19 de Outubro, na zona da Coop, em Maputo. Ambos morreram no local. O crime foi amplamente condenado pela comunidade internacional, incluindo a União Europeia, Nações Unidas e União Africana, que exigiram uma investigação transparente.
O governo moçambicano garantiu, na altura, que o caso seria esclarecido, mas até hoje não há detidos nem resultados concretos das investigações conduzidas pelo Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC). Organizações como a Human Rights Watch e o Centro para a Democracia e Direitos Humanos (CDD) acusam as autoridades de “silêncio cúmplice” e de falhar na protecção de figuras da oposição.
Vozes que não se calam
Durante a cerimónia de homenagem, a presidente da OAM, Maria Alage, sublinhou que “a morte de um advogado pelo exercício da sua profissão é um ataque directo ao Estado de Direito”. A dirigente anunciou também a criação do Prémio Elvino Dias de Defesa dos Direitos Humanos, destinado a distinguir advogados que se destaquem na promoção da justiça social.
Por seu lado, o partido PODEMOS voltou a exigir uma comissão de inquérito independente, alertando que “a democracia moçambicana continua ferida” e que “a impunidade encoraja novos actos de violência política”.
Contexto de tensão e medo
As eleições de 2024, consideradas as mais tensas dos últimos 15 anos, foram marcadas por acusações de manipulação eleitoral, prisões arbitrárias e repressão de manifestações em várias províncias. O assassinato de Elvino Dias e Paulo Guambe ocorreu num momento em que o país vivia protestos e confrontos entre apoiantes da oposição e forças de segurança.
Observadores da Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (MOE-UE) classificaram o duplo homicídio como “um acto de intimidação política” e alertaram que “a ausência de responsabilização mina a confiança dos cidadãos nas instituições públicas”.
Um legado que inspira
Um ano após o crime, o nome de Elvino Dias tornou-se símbolo de resistência e de coragem entre jovens juristas e activistas. Nas redes sociais, multiplicaram-se mensagens com a hashtag #JustiçaParaElvinoEDias e #PauloGuambeVive, acompanhadas de vídeos e testemunhos sobre o trabalho das vítimas em prol de um país mais justo.
A viúva de Elvino Dias, Anastácia Muanza, emocionada, afirmou durante a homenagem:
“Eles tentaram calar a voz da justiça, mas não conseguiram. O Elvino acreditava num Moçambique livre, e é essa esperança que hoje nos traz aqui.”
O silêncio que permanece
Passado um ano, o caso continua envolto em silêncio. As famílias exigem respostas, os advogados pedem justiça, e a sociedade civil não quer esquecer. O duplo assassinato de Elvino Dias e Paulo Guambe permanece uma ferida aberta na história recente de Moçambique — um lembrete trágico de que a luta pela verdade e pela democracia pode custar a vida, mas também que a memória dos que caíram é uma semente de mudança.
Por: Redação 8000
Data: 19 de outubro de 2025
Local: Maputo, Moçambique
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